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Colonização precoce: ponto de partida para uma produção avícola segura

Escrito por: Paulo Martins - Diretor Técnico e Comercial da Biocamp
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Colonização precoce: ponto de partida para uma produção avícola segura

ANTES DE COMEÇAR…

A evolução das aves é um tópico fascinante na biologia. De acordo com as evidências fósseis, as aves evoluíram a partir de um grupo de dinossauros, no período Jurássico, entre 150 a 200 milhões de anos.

Mesmo após a extinção dos dinossauros, as aves continuaram a evoluir. Sua capacidade de adaptação, nos mais diversos ambientes ecológicos, possibilitou que hoje, as aves constituam um grupo diversificado e bem-sucedido de vertebrados, com mais de 10.000 espécies reconhecidas em todo o planeta.

Nesse longo caminho, de milhões de anos, alguns fatos são comuns à todas as espécies: elas sempre necessitaram de cuidados parentais e, receberam, como herança, a microbiota de seus progenitores, através do ovo e das fezes deixadas nos ninhos.

Entretanto, na moderna indústria avícola, onde bilhões de aves e ovos são produzidos anualmente para o consumo humano, as aves não somente nascem, mas também são criadas totalmente isoladas de suas mães, por diversas razões, dentre elas, motivos técnico-econômicos e sanitários.

 

O conceito de “Saúde Única” consiste numa abordagem interdisciplinar – desenvolvida por uma aliança quadripartite de organismos internacionais: FAO, OMS, OMSA, ONU – que reconhece a interconexão entre a saúde humana, a saúde animal e a saúde do ecossistema.

Essa abordagem foi desenvolvida para lidar com questões de saúde de forma holística, considerando o impacto das doenças em humanos, nos animais e no meio ambiente.

O uso de AMC na produção animal tem levado, cada vez mais, ao surgimento de bactérias resistentes, o que representa um significativo risco à saúde humana. Essas preocupações resultaram na promulgação de leis, pelas autoridades nos diferentes países, limitando o uso de AMC em animais, e assim impulsionando a necessidade da indústria avícola de encontrar estratégias alternativas para o controle e tratamento de infecções bacterianas.

Sem dúvida, a colonização precoce do trato gastrointestinal das aves é uma das estratégias que apresentam melhor retorno econômico do seu investimento.

 

Na produção avícola industrial, sem nenhum contato físico com seus progenitores, o pintinho recém-eclodido não recebe como herança sua carga de microbiota protetora de seu trato gastrointestinal (TG), de suas mucosas e de sua pele.

Isso o torna um alvo mais fácil para as infecções por microrganismos oportunistas ou patogênicos, sobretudo pelas vias umbilical, digestiva e respiratória.

Exatamente por esse motivo, nos últimos 60 anos, a indústria avícola se valeu dos antimicrobianos (AMC), utilizados largamente de forma preventiva e curativa, para contornar e controlar este e outros desafios e enfermidades.

 

  • “PRINCÍPIO DE NURMI”

Desenvolvido pelo cientista finlandês Olli Nurmi, é fundamentado na premissa de que a microbiota benéfica que habita o trato gastrointestinal (TG) das aves adultas pode competir com as salmonelas patogênicas, desempenhando um papel crucial na prevenção da colonização e das infecções. Este conceito foi pioneiramente explorado por Nurmi e Rantala em 1973, ao descreverem o mecanismo conhecido como “exclusão competitiva” (EC) como uma ferramenta eficaz no controle da salmonela.

Suas pesquisas evidenciaram que a colonização inicial do TG das aves jovens, com bactérias provenientes de aves adultas, poderia protegê-las contra a colonização subsequente por salmonela.

Essa estratégia, hoje inserida na avicultura industrial, tem como objetivo salvaguardar as aves de produção, de qualquer idade, contra bactérias patogênicas que possuem capacidade de colonizar o TG das aves e, eventualmente, invadir a corrente circulatória, desencadeando doenças sistêmicas.

Por este motivo, essas bactérias podem representar uma ameaça à saúde humana quando produtos avícolas contaminados, como carne e ovos, são consumidos.
Existem várias estratégias comuns para implementar o Princípio de Nurmi, incluindo:

  1. Administração de culturas probióticas (NAGF, DFM): Inclui a introdução de culturas de bactérias benéficas (probióticos) na dieta das aves, promovendo o crescimento dessas bactérias no TG.
  2. Utilização de ingredientes na ração que estimulam o crescimento de bactérias benéficas, como os ácidos orgânicos, prebióticos (FOS, MOS), óleos essenciais, extratos vegetais.
  3. Redução do uso de antimicrobianos, principalmente de forma preventiva, pois essas drogas, utilizadas de forma periódica ou contínua, afetam negativamente a microbiota intestinal, promovendo a disbiose, além de elicitar o desenvolvimento de bactérias resistentes.
  4. Biosseguridade e boas práticas de manejo e higiene: princípios e processos fundamentais para diminuir o risco de infecções.

 

Cada vez mais, as pesquisas e provas de campo mostram que microbiota do TG exerce uma função fundamental, não somente neste sistema, mas também no sistema imune, respiratório, nervoso e tegumentar, o que resulta em benefícios significativos em termos de nutrição, metabolismo, fisiologia, imunidade, saúde e bem-estar.

Esta complexa comunidade de microrganismos, predominantemente compostos por bactérias, evolui, se desenvolve, se adapta e coloniza o intestino das aves, desempenhando um papel fundamental na manutenção da integridade intestinal. Seus efeitos, no TG, se traduzem em:

A microbiota, entretanto, não permanece estática. Antes mesmo do nascimento do pintinho, ela já está presente, mas se encontra ainda em uma fase rudimentar, e, ao longo de todo o ciclo de vida das aves, fatores ambientais diversos influenciam sua composição e equilíbrio.

As bactérias benéficas estão constantemente em competição com aquelas que podem representar uma ameaça à integridade intestinal. O termo chave aqui é “equilíbrio”, ou eubiose.

Bactérias potencialmente patogênicas podem estar associadas às aves reprodutoras, ao processo de incubação dos ovos, à cama das aves, às instalações de criação, à ração e água.

Esses fatores, combinados com uma microbiota intestinal rudimentar ao nascimento, tornam os pintinhos extremamente vulneráveis à infecção por bactérias patogênicas, durante os primeiros dias de vida.

 

A aplicação de probióticos com múltiplas cepas láticas ou de exclusão competitiva, ao nascimento, contribui para a formação de uma microbiota benéfica e reforça a proteção contra bactérias patogênicas. No entanto, para garantir a eficácia do produto, é essencial aplicá-lo corretamente.

 

Atualmente, existem duas maneiras de realizar a colonização precoce das aves: através da aplicação do probiótico dentro do ovo entre o 18o e 19o dia de incubação ou por meio de pulverização (spray) imediatamente após o nascimento.

O processo de vacinação in ovo geralmente ocorre durante a transferência dos ovos da incubadora para o nascedouro. No mercado, há diversos tipos e modelos de equipamentos para realizar a vacinação in ovo.

De uma maneira prática, todos eles perfuram a casca dos ovos para introduzir a solução vacinal, e, em alguns casos, é possível adicionar nutrientes e probióticos.

Um ponto crítico a ser observado é o momento da aplicação. Como a colonização pelo probiótico é um processo entérico, o pintinho deve ingerir o produto através do líquido amniótico e/ou albúmen, e em quantidade suficiente. Isso só ocorre quando a aplicação é realizada entre 18 dias e 12 horas e 18 dias e 22 horas. Vale ressaltar que o tempo cronológico nem sempre coincide com o tempo biológico e fisiológico das aves, e cada ave pode ter seu próprio ritmo. Portanto, a janela de aplicação é curta e requer atenção constante.

Quanto à aplicação via spray, as vacinas e probióticos podem ser administrados simultaneamente por meio de uma máquina de pulverização.

Esse processo é relativamente simples e fácil de executar, mas demanda cuidados especiais para garantir a colonização precoce eficaz. Para cada caixa contendo 100 pintinhos, o volume aplicado deve variar entre 15 e 21 mL da solução vacinal/probiótica.

Aplicar a solução via spray gota grossa (cerca de 200 micras) observando que a distribuição seja uniforme e contemple toda a superfície da caixa.

A adição de corantes também desperta o interesse das aves, promovendo o consumo das gotas com probióticos, e facilita a avaliação da qualidade da aplicação.

Aproximadamente 95% dos pintinhos devem apresentar a língua corada, indicando que ingeriram a solução aplicada. Portanto, a aplicação mais eficaz do probiótico em spray, no incubatório, é aquela que permita equilibrar os seguintes pontos:

 

A produção avícola é um dos setores com um dos melhores índices de eficiência na conversão de grãos em alimentos de alto valor biológico, de menor pegada de carbono e de água.

Manter uma elevada eficiência alimentar é essencial para o setor avícola atender à crescente demanda de proteína animal, ao mesmo tempo que representa também um grande desafio, uma vez que a produção intensiva de aves pode ser afetada por doenças infecciosas, algumas de caráter zoonótico.

Se a microbiota intestinal é crucial para a saúde das aves, por sua vez a colonização precoce torna-se um dos principais pontos de partida para uma produção avícola sustentável.

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