As recentes infecções por um novo tipo de Coronavírus vêm se tornando uma pandemia, assustando e alterando as movimentações e comportamento humano ao redor do mundo, com enormes efeitos sobre a economia global.
Trata-se, como é de conhecimento, de uma mutação e adaptação do vírus de origem animal para o homem. Neste clima aumenta a suspeição dos animais, incluindo as aves, como possíveis reservatórios e transmissores ao homem de Coronavírus.
O Brasil é o maior exportador de carne de aves do mundo.
Como este vírus se manifesta nas aves e qual seu efeito na saúde pública? É o que este texto procura trazer: algum esclarecimento sobre o tema.
Dentro do que se denomina de coronavirus está uma grande variedade de vírus com algumas características comuns, os quais circulam continuamente entre o homem e animais em geral. Aqueles que afetam as aves foram classificados em 2016 dentro do gênero gama, distantes dos gêneros alfa e beta que infectam o homem e animais domésticos.
Para a avicultura industrial o vírus gama mais representativo é causador de uma doença altamente contagiosa denominada de “Bronquite Infecciosa das Galinhas – BIG”. Vírus semelhantes ao da BIG podem infectar e causar sintomas clínicos em perus, galinha d’angola e codornas. Também, estes vírus podem ser encontrados de algumas aves silvestres assintomáticas.
Na década de 50 o Prof. Osmane Hipólito retorna dos Estados Unidos (EUA) ao Brasil para a UFMG em Belo Horizonte (BH). Lá nos EUA, trabalhara no seu PhD com a BIG que era uma das mais graves doenças avícolas daquele momento.
Como conseqüência quase que natural, o Prof. Osmane buscou em galinhas comercializadas vivas no mercado municipal de BH a presença de anticorpos e do vírus da BIG. Encontrou os dois, mas nenhum dos sintomas da doença. Ou seja, o vírus da BIG estava circulando, mas não causava qualquer sinal clínico.
Sua curiosidade de pesquisador o manteve em alerta constante. Em meados dos anos 70, portanto, 20 anos depois desta observação, a BIG explode como doença epidêmica nas mais diversas regiões de criação avícola em todo o país com enormes prejuízos econômicos.
Vacinas não eram disponíveis no Brasil ou qualquer outra forma de prevenção para uma doença altamente contagiosa. Portanto, nossos plantéis da avicultura industrial, em enorme explosão de crescimento, se encontravam totalmente susceptíveis ao novo vírus e a uma nova doença.
Não a uma única, mas nas suas mais variadas formas; respiratória – a mais comum -, renal (síndrome nefrite-nefrose), reprodutiva (queda de produção, falsas poedeiras e fertilidade dos machos) e entérica. Frangos, poedeiras e reprodutoras eram igualmente infectados em todas as partes do Brasil. Uma catástrofe geral.
Por um movimento liderado pelo Prof. Osmane, no final dos anos 70 o MAPA (Ministério da Agricultura e do Abastecimento) autoriza a importação de vacinas vivas dos EUA, e a vacinação foi praticada em massa. Desde então é controlada com o uso de vacinas vivas e inativadas.
O coronavírus da BIG continua circulando entre os planteis avícolas, mas a evolução da prática da biosseguridade nas granjas avícolas com os diferentes planos de vacinação, mantém a BIG dentro de um panorama de baixo risco para a avicultura industrial brasileira e completamente controlada.
Há evidências mundiais de que mutantes do Coronavirus dos gêneros alfa e beta cruzaram barreiras entre morcegos e humanos, com ação de agentes intermediários.
Entretanto, não há qualquer referência de que os coronavírus que causam a BIG possam afetar os humanos, o que deixa sem qualquer risco para o mercado mundial do comércio de ave e seus produtos, como a necessidade de qualquer equipamento de proteção pessoal específico (máscaras, p.ex.) para trabalhadores que lidam com as aves nas criações industriais.
Edir Nepomuceno – Ex-Professor USP/Unicamp
edirnepo@unicamp.br