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O Gallibacterium anatis bv, haemolytica (conhecido anteriormente como Pasteurella haemolytica) é um comensal habitual do trato respiratório superior e do trato reprodutivo inferior de galinhas saudáveis, mas esta bactéria também foi identificada como causadora de salpingite e peritonite em galinhas reprodutoras pesadas e galinhas de postura em muitos países, levando a uma redução na produção de ovos e a um aumento da mortalidade.
Biovares de G. anatis
O Gallibacterium anatis, um membro da família Pasteurellaceae, apresenta dois biovares: G. anatis bv. haemolytica e G. anatis bv. anatis.
A bactéria patogênica G. anatis bv. haemolytica, denominada assim por sua capacidade de provocar a hemólise das hemácias, anteriormente foi designada Pasteurella haemolytica. O G. anatis está associado à salpingite e peritonite em galinhas de postura, e também foi isolado como causador de doença em patos, gansos e avestruzes.
A transição de comensal para patogênico
Apesar de ter sido identificada como causadora de doença em galinhas, particularmente em galinhas de postura –Gráfico 1–, o potencial patogênico do G. anatis é controvertido. Por um lado, o G. anatis pode aparecer formando parte da microbiota do trato respiratório superior e o trato reprodutivo inferior das galinhas, sem provocar nenhum tipo de efeito adverso sobre sua saúde ou produtividade.
G. anatis foi identificado também como causador de septicemia, pericardite, hepatite, ooforite, salpingite, peritonite e degeneração folicular, com os efeitos negativos conseguintes sobre a sobrevivência e produtividade do lote.
Fatores que contribuem para a potencial ação patogênica de G. anatis
Embora o mecanismo pelo qual se produz a mudança de comensal para patógeno ainda não seja de todo conhecido, existe uma série de fatores dependentes do hospedeiro que contribuem para a potencial ação patogênica de G. anatis:
Influências hormonais
Estresse
Mudanças sazonais
Imunossupressão
Predisposição genética
(presumivelmente)
Diversidade de cepas
Além dos fatores extrínsecos à bactéria, existem fatores intrínsecos, específicos da cepa que parecem ter um importante papel, determinando a apresentação e magnitude da infecção.
A diferenciação de cepas de G. anatis é uma importante ferramenta que facilita a pesquisa, os estudos epidemiológicos e o desenvolvimento de vacinas.
Epizootiologia
Transmissão horizontal vs vertical
Embora a transmissão horizontal seja aceita como via principal de transmissão entre lotes, existem evidências que sugerem a possibilidade de se produzir uma transmissão vertical –transovariana– de G. anatis.
Fatores de virulência
As variações na expressão de fatores de virulência entre as diferentes cepas poderiam explicar as diversas apresentações da infecção por G. anatis. Na atualidade, estão sendo realizados estudos para identificar os fatores de virulência associados a G. anatis a fim de esclarecer sua ação patogênica no organismo, podendo também assentar as bases para o desenvolvimento de vacinas.
- O fator de virulência mais bem caracterizado do Gallibacterium anatis, a toxina GtxA –Gallibacterium toxina A–, tem atividade hemolítica e leucotóxica.
- A fimbria FlfA –família de fimbrias F17- like– também se revelou importante para a virulência do G. anatis.
- Outros possíveis fatores de virulência incluem a capacidade de o G. anatis produzir material capsular, secretar metaloproteinases capazes de degradar as IgG da galinha, formar biopelículas e produzir a hemaglutinação de hemácias.
Sinais clínicos e patogenia
O G. anatis é cada vez mais reconhecido como um importante causador de salpingite e peritonite em galinhas de postura, o que resulta em uma elevada mortalidade e em uma redução da produção de ovos.
Após a infecção natural e experimental de galinhas reprodutoras e de postura, observou-se:
Hepatite –Figura 1.
Lesões do trato respiratório superior.
Inflamação com hemorragias com ruptura e regressão dos folículos ovarianos, gemas na cavidade celômica –Figura 2.
Peritonites e salpingite –Figura 3.
Hemorragias no oviduto e quedas na produção de ovos.
As lesões associadas à infecção por G. anatis não são patognomônicas e podem ser indistinguíveis das produzidas por E. coli.
- Demonstrou-se que casos de Coriza Infecciosa se exacerbavam e apresentavam uma maior mortalidade quando se produzia a coinfecção com Avibacterium paragallinarum G. anatis.
- Em galinhas de postura na América Latina diagnosticadas com Tifo Aviário –causado por Salmonella gallinarum–, o G. anatis pode ser isolado a partir de traqueia, folículos ovarianos e ovidutos. A mortalidade e a queda da postura foram maiores nos galpões infectados com Salmonella Gallinarum e G. anatis do que naqueles afetados somente por Salmonella Gallinarum. Além dos sinais associados ao Tifo Aviário, as galinhas coinfectadas com Salmonella Gallinarum e G. anatis apresentavam maiores sinais de doença respiratória.
No PRDL, recentemente identificamos como causa da elevada mortalidade em um lote de galinhas reprodutoras de 42 semanas uma coinfecção com G. anatis e E. coli O128:H14.
A mortalidade diária no galpão mais afetado atingiu um pico de 2,36% (231 galinhas), precedido de uma queda na produção diária de ovos de 16% durante um período de 10 dias.
- Observaram-se lesões hemorrágicas em múltiplos órgãos internos, incluindo os folículos ovarianos e as vísceras –Figuras 4a-d–, como resultado de uma severa bacteriemia multiorgânica com vasculite. Essas lesões foram confirmadas mediante histologia –Figura 4e.
- O G. anatis e a E. coli foram isolados a partir de amostras de baço e medula óssea, sem que se pudessem detectar outros patógenos mediante cultivo bacteriano, isolamento de vírus ou PCR.
Antibióticos – Tratamento e resistência
O G. anatis se destaca por sua grande resistência antimicrobiana e constitui um desafio do ponto de vista terapêutico, o que evidencia a importância de aplicar técnicas de cultivo e identificação bacteriana, incluindo a determinação da sensibilidade antimicrobiana –antibiograma–, para implementar um tratamento adequado do lote.
Dos isolados de G. anatis avaliados recentemente pelo PRDL, 46 de 49 (94%) foram multirresistentes (resistentes a três ou mais tipos de produtos antimicrobianos) – Gráfico 2:
- Resistência geral a clindamicina, novobiocina, tetraciclinas e tilosina.
- Sensibilidade geral aos aminoglucosídeos, ceftiofur, enrofloxacina, florfenicol e sulfatrimetroprim.
- Sensibilidade intermediária a eritromicina, espectinomicina e sulfatiazol.
- Resistência variável a β-lactâmicos e sulfadimetoxina.
Prevenção e controle
Da mesma forma que em outras doenças aviárias, excelentes medidas de biossegurança, altos padrões de manejo do lote, condições ambientais adequadas e atenção ao bem-estar animal são ferramentas importantes para a prevenção e o controle das infecções por G. anatis.
Dado que G. anatis se manifesta frequentemente como um patógeno oportunista, a prevenção e o controle de doenças imunossupressoras é importante.
Considerando a capacidade de G. anatis para formar biopelículas, devem implementar-se medidas especiais para prevenir sua formação, incluindo uma qualidade excelente da água para beber, bem como limpeza e desinfecção regular das dutos de água.