Dr. Vicent, o setor brasileiro de produção de ovos vive um momento delicado por questões relacionadas à alta histórica de custos. Como o Marketing pode ajudar o produtor de ovos num momento como este?
Vincent Guyonnet – Antes de mais nada, é importante mencionar que não tenho o prazer de visitar o Brasil desde 2012, quando me apresentei no XXIV Congresso Mundial de Avicultura em Salvador, Bahia. Então, meus pontos de referência para o setor brasileiro de ovos estão, obviamente, desatualizados. Mas vou usar experiências de muitos outros mercados ao redor do mundo para oferecer algumas ideias que podem ser aplicáveis ao mercado brasileiro.
De acordo com os dados da ABPA, o consumo anual per capita de ovos passou de 148 para 251 nos últimos dez anos. São mais 103 ovos por pessoa!
Este é um número fantástico e tenho certeza de que está relacionado às ações de marketing implementadas pelo setor brasileiro de ovos. |
As pessoas, muitas vezes, acreditam que não há necessidade de anunciar um produto tão conhecido como o ovo. Isso não é verdade.
Por que você acha que marcas populares de refrigerantes, roupas esportivas ou telefones celulares gastam milhões em publicidade de produtos e marcas que quase todo mundo conhece? |
Bem, você precisa lembrar constantemente os consumidores sobre seus produtos. Com alimentos de origem animal, os consumidores têm muitas opções e devemos lembrá-los continuamente sobre os ovos e o que eles podem oferecer.
Temos tantas histórias boas para contar sobre ovos:
E podemos acrescentar também o aspecto de sustentabilidade da produção de ovos. Mais do que nunca, os produtores de ovos devem unir forças e, juntos, investir em uma ampla gama de atividades para crescer ainda mais o segmento no Brasil.
Essas são boas metas para os produtores brasileiros, mas para conquistar mais “share of stomach” no mercado de proteína animal, devemos promover e divulgar continuamente os ovos. Trabalho de marketing e branding!
Essas gerações pensam, compartilham valores e têm necessidades diferentes. Devemos adaptar nossas abordagens de marketing para abordá-los, entrar no campo do Marketing Digital.
Devemos contar a eles o que estamos fazendo para preservar o meio ambiente e nosso planeta. O setor de ovos tem uma grande história para contar sobre Sustentabilidade e devemos fazê-lo! |
O Sr. tem grande experiência internacional e o movimento de ciclos de altas e baixas de ganhos no setor de produção de ovos certamente não é uma exclusividade do Brasil. O que deveria ser feito para que o produtor consiga passar ileso pelos momentos de baixa lucratividade, ou até perdas econômicas?
VC– Em condições econômicas difíceis, podemos pensar amplamente em duas opções:
Em termos de produção, as rações são nosso maior custo. O custo, a formulação e a utilização da ração pelas aves podem ser ajustados para garantir que obtenhamos o maior número de ovos, com a menor quantidade de ração. Mas alimentos mais baratos, nem sempre significam mais lucros.
Já estamos fazendo todo o possível para maximizar a quantidade de ovos produzidos por quilo de ração? Estou confiante de que a resposta é Não. |
O setor de ovos (em todos os países) é bastante conservador e, geralmente, relutante em adotar tecnologias mais novas. Precisamos abraçar as mudanças e inovações. Alguns desses ingredientes trazem inúmeros benefícios que podem fortalecer o esforço de diferenciar nossa marca e produto.
Por exemplo, um estudo recente no Brasil mostrou que a adição de uma enzima à ração não apenas melhorou a eficiência alimentar, mas também reduziu a emissão geral de CO2 por quilo de produto.
Do lado dos preços, obviamente, aumentar os preços quando o cidadão médio está lutando não é uma boa opção. Mas temos a oportunidade de segmentar ainda mais o mercado e criar uma série de produtos especiais, que ofereceriam um diferencial em relação aos ovos normais.
Devemos passar de um mercado genérico de ovos para um mercado em que possamos oferecer aos consumidores muitas opções, algumas com um preço premium. |
O processamento de ovos e o segmento de produtos posteriormente transformados também é uma opção para criar produtos de maior valor agregado e premium.
No cenário atual mundial e do Brasil, quais poderiam ser as saídas para a crise do mercado de ovos?
VC – Se você observar os dados recentes da FAO, a produção global de ovos cresceu 2,3% entre 2019 e 2020, adicionando 2,3 milhões de toneladas extras de ovos. Então, eu diria que globalmente o setor teve um desempenho muito bom durante o primeiro ano da pandemia da COVID-19.
Mas é verdade que vivemos tempos difíceis. A diversificação é provavelmente uma de nossas opções no Brasil.
Acredito piamente na importância do processamento de ovos para expandir ainda mais o tamanho do setor e criar novas oportunidades no Brasil. |
Na França (36%), Canadá (27%) ou EUA (27%), o consumo de ovoprodutos é menor do que no Japão, mas ainda muito, muito maior do que no Brasil. Acredito que esta seja uma excelente oportunidade para os produtores brasileiros.
Menos de 10% da produção global de ovos está sendo processada em ovos líquidos, em pó ou outros tipos de ovoprodutos processados. |
Em relação ao setor brasileiro de produção de ovos, que barreiras o senhor acredita que ainda precisam ser vencidas para que o setor avance com maior velocidade?
VC – Eu gostaria de poder responder a essa pergunta depois de conversar com mais produtores brasileiros durante o XIX Congresso da APA!
Esse mesmo estudo também demonstrou que os consumidores americanos estavam mais interessados nos benefícios proporcionados pelo alimento, do que sobre os vários nutrientes do ovo.
Acho que precisamos fazer um uso muito melhor dos dados das mídias sociais para ajustar nossas mensagens aos consumidores.
Precisamos encontrar mais formas de consumir ovos – é por isso que gosto muito da opção de construir um negócio de processamento de ovos no Brasil. Os consumidores terão mais oportunidades de consumí-los.
O senhor acredita que o apelo ESG (Environmental, Social and Corporate Governance) é uma boa oportunidade para o avanço do setor de produção de ovos? Por que?
Em 2013, a FAO publicou uma revisão abrangente do setor de produção pecuária e seus impactos no meio ambiente. Mostrou que: – O setor de ovos contribui com apenas 2,3% das emissões totais de gases de efeito estufa (cerca de 200 mi de toneladas de CO2 equivalente).
Se considerarmos as emissões/kg de proteína produzida, os ovos têm cerca de 1/10 das emissões da produção de carne bovina.
E se nos concentrarmos nos aminoácidos essenciais (os pequenos blocos de construção das proteínas, fundamentais em nossa dieta), a história fica ainda melhor.
Em termos de nutrição, os ovos têm o menor impacto no meio ambiente, comparado a todos os alimentos de origem animal. |
Temos também dois estudos nos EUA e do Canadá que demonstram claramente que o setor avançou muito nos últimos 50 anos, tanto em termos de produtividade, quanto em redução de seu impacto em nosso planeta.
As gerações mais jovens de consumidores se preocupam com essas questões. Uma pesquisa global realizada em 2020 com quase 19 mil consumidores (3% do Brasil) mostrou que 44% estão dispostos a mudar seus hábitos de compra de alimentos e bebidas para reduzir seu impacto no meio ambiente.
Apenas 35% dos consumidores responderam à compra de alimentos apenas com base no preço. Essa mudança geracional traz um novo conjunto de valores que realmente representa uma oportunidade fantástica para o setor de ovos. Vamos correr com isso!