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Qual o futuro da regulação do bem-estar na avicultura de postura?

Escrito por: Priscila Beck
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Conteúdo disponível em: Español (Espanhol)

A construção de um marco legal que regule o bem-estar animal na avicultura de postura brasileira é necessidade primordial diante de um mercado cada vez mais exigente. E não se trata de um trabalho simples, diante da realidade de um país como Brasil, com dimensões continentais e diferenças enormes no sistema produtivo entre suas regiões.

Com esse objetivo, mais de 400 pessoas, entre produtores de ovos e pesquisadores, estiveram reunidos Ribeirão Preto (SP) na manhã de hoje (20/3), num Simpósio que precedeu a abertura do XVI Congresso de Ovos da APA. O diretor Executivo da Associação Paulista de Avicultura, José Roberto Bottura, destacou que a abertura do espaço dentro do Congresso para o debate se deve à importância de que o setor avance nesse debate.

O Pré-Congresso é uma das etapas do projeto Bem-Estar em Poedeiras, que vem sendo desenvolvido desde junho de 2016, numa parceria entre o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Embrapa Suínos e Aves e Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP).

Tendência de Mercado

Um dos palestrantes do evento, Fernando Bicaletto, que é diretor comercial e de operações na Fazenda da Toca Orgânicos, apresentou trabalhos que apontam macrotendências e tendências do mercado consumidor internacional e brasileiro. Entre as macrotendências apuradas por uma empresa inglesa estão o crescimento da longevidade populacional, a globalização dos mercados, escassez de recursos naturais como a água, facilidade de disseminação e disponibilidade da informação e inovação social e ecológica.

Fernando fez um cruzamento dessas macrotendências, com as principais tendências de mercado como consolidação do consumo consciente, bem-estar, saudabilidade e retorno às origens. Ele apresentou uma pesquisa realizada no mercado brasileiro que aponta que 29% dos entrevistados preferem comprar marcas que tenham práticas sustentáveis, 30% evita comprar de empresas que têm histórico ambiental ruim e 22% preferem comprar de empresas socialmente responsáveis.

Segundo Bicaletto, há uma movimentação de grandes grupos para, até 2020, 2025, atender a essa demanda, comprando apenas ovos de aves criadas sem gaiola. “Essa mudança veio para ficar, a demanda está aí e vai crescer”, frisou Bicaletto. “São sinais claros para a indústria, sobre a necessidade de buscar alternativas eficientes”, completou.

Bicaletto apresentou dados do USDA, de novembro do ano passado, que apontam que de 2016 para 2017, a produção de ovos no sistema cage free cresceu 61% nos Estados Unidos. Ele também informou que a produção de ovos especiais cresce entre 30 e 40% ao ano no Brasil, segundo dados de redes varejistas.

Visão do Mercado Varejista

Edival Veras de Barros Campello Filho, da Associação Avícola de Pernambuco (Avipe) destacou que é necessário que o setor tenha muita responsabilidade na discussão do tema, porque ela interfere no futuro da produção de ovos no Brasil.

Ele destacou como pontos a serem considerados, a necessidade, de até 2030, dobrar a quantidade de alimentos produzidos para atender à população mundial e a cogitação de que em 2050 possa faltar alimento para atender toda a população mundial. Destacou também o papel do ovo enquanto alimento nutritivo e barato, que pode ajudar a minimizar os altos índices de pobreza no mundo, que segundo ele atinge cerca de 800 milhões de pessoas.

Segundo Edval, os países com potencial para desenvolver muito a produção de ovos são o Brasil e os Estados Unidos. Ele destacou ainda que a avicultura de postura, desde seu surgimento, se desenvolve com foco em produzir ovo com baixo custo, informando que as galinhas de hoje produzem cerca de 107 ovos a mais do que produziam há 30 anos.

“O desafio de produzir em sistema semi-intensivo contraria essa tendência, aparentemente”, afirmou Edval. Ele apresentou dados do Instituto Ovos Brasil (IOB), que apontam que o crescimento da produção de ovos no Brasil deverá crescer entre 10% e 15% em 2018, frente à produção de 39 bilhões de ovos em 2017.

“Nós vamos precisar sair do consumo médio de 192 ovos em 2017, para algo em torno de 215 ovos”, salientou Edval. “Ontem à noite, já vimos que o Brasil, nesse início de ano, está com um consumo aproximado de 205 ovos”, completou.

“É viável produzir de qualquer forma, desde que a gente tenha tecnologia e responsabilidade no que a gente está fazendo”, ponderou Edval.

Tecnologia para atender a demanda

Cláudio Machado, gerente geral da Vencomatic no Brasil, destacou a necessidade de o Brasil ter uma norma única que regule a adoção de práticas de bem-estar animal na produção de ovos.  Como exemplo do que pode gerar conflito na falta de uma regulação única, que esteja de acordo com as normas internacionais está no fato de que alguns regulamentos apontam limite de 6 aves/m2, enquanto outras normativas determinam 9 aves/m2 para o sistema Cage Free.

Não existe definição também sobre se o espaço do ninho entra na contagem da limitação desse espaço. Machado demonstrou preocupação especial, em termos sanitários, com o sistema Free Range, no qual as aves possuem períodos de liberdade.

A experiência dos Estados Unidos foi apontada como algo a ser observado, porque naquele país a normatização foi realizada por estados e há muitas incongruências entre as certificadoras.

Formação e normas técnicas

Além de apontar caminhos para a construção de um marco legal para o bem-estar na avicultura de postura brasileira, que conte com a participação do setor produtivo, o trabalho conjunto do MAPA, Embrapa e Esalq também visa produzir materiais didáticos e normas técnicas sobre boas práticas de produção de ovos.

A pesquisadora Helenice Mazucco, do Núcleo Temático de Produção de Aves da Embrapa Suínos e Aves (Concórdia, SC) apresentou panfletos e vídeos-aulas que estão sendo produzidos dentro do projeto. Também informou sobre a elaboração de um manual que será divulgado no encerramento do projeto, previsto para 2019.

O projeto trabalha ainda na construção de uma circular técnica sobre Cage Free, um boletim técnico sobre gaiolas enriquecidas, um artigo sobre depopulação de aviários e modificações de aviários californianos.

“Existe uma preocupação em desmistificar o vilão do bem-estar animal, aproximar os produtores e levar informação a eles de forma mais clara, para esclarecer que bem-estar animal não é só tirar as galinhas das gaiolas, colocar no chão e produzir a qualquer preço”, explicou o professor Iran José Oliveira da Silva, que é coordenador do Núcleo de Pesquisa em Ambiência (Nupea), ligado ao Departamento de Engenharia de Biossistemas da ESALQ/USP.

Pelo projeto, o grupo já promoveu debates sobre o Bem-estar Animal em Poedeiras nos municípios paulistas de Piracicaba, Bastos e Guatapará. Em 2018, além do Pré-Congresso em Ribeirão Preto, o grupo promoverá o 2º Egg Production Precision Day em Piracicaba e, no segundo semestre, realizará eventos nos municípios paranaenses de Maringá e Realeza.

Tendência mundial

Representando o MAPA, Lizie Buss, chefe de Divisão de Boas Práticas e Bem-Estar Animal, explicou, via áudio enviado aos organizadores do evento, que o Brasil, enquanto signatário da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE),  vem adotando medidas que atendem as orientações do organismo.

Entre as orientações da OIE estão reforçar o desenvolvimento de normas, competências de educação, comunicação clara com os governos e público, implantar políticas e normas com focos nos animais.

Lizie também apontou a utilização de práticas de bem-estar animal enquanto aliada para a redução do uso de antimicrobianos. Segundo ela, trabalhos publicados demonstram que o estresse crônico provoca a queda da imunidade nos animais, que por sua vez reflete na maior utilização de medicamentos.

Direto de Ribeirão Preto

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