Alimentação inteligente para aves livres: o que considerar?

A criação de aves livres de gaiolas está se tornando uma prática cada vez mais comum no Brasil e no mundo. Embora as gaiolas convencionais em bateria para aves poedeiras ainda prevaleçam, o movimento em direção a sistemas alternativos está ganhando impulso para além da Europa. No sistema convencional, as galinhas permanecem em gaiolas durante todo o período de produção, com alimentação, iluminação e temperatura controladas. 

Em um sistema livre de gaiolas elas permanecem dentro do galpão sem acesso a área externa, nos sistemas com acesso aos piquetes como: caipiras e orgânicos, além do número de galinhas poedeiras por m2 (indoor e outdoor), há diferenças no tipo de ingredientes utilizados na ração (Figura 1).  

 Figura 1 – Características dos sistemas de produção de ovos | *O antibiótico na produção de ovos caipira pode ser utilizado para tratamento. 

Figura 1 – Características dos sistemas de produção de ovos | *O antibiótico na produção de ovos caipira pode ser utilizado para tratamento.

No sistema de gaiola convencional, a produtividade, a qualidade dos ovos e as exigências nutricionais das galinhas poedeiras são bem conhecidas. No entanto, ainda faltam pesquisas relacionadas com sistemas de habitação alternativos. Ao produzir ovos em diferentes sistemas de alojamento, surge uma questão que deve ser considerada: Como alimentar aves livres de gaiola?

Independentemente do sistema de alojamento adotado na granja, geralmente as dietas formuladas para aves de postura utilizam tabelas de requerimentos que são baseadas nas exigências de aves criadas em ambiente de gaiolas. Nesse sentido, acredita-se que os nutrientes estão sendo fornecidos de forma subestimada, o que pode prejudicar o desempenho dos animais e a qualidade dos ovos. 

A seguir, vamos discutir sobre os principais pontos que devem ser considerados na alimentação de aves livres de gaiolas. 

  • Energia. 

Aves com acesso a área externa, como nos sistemas caipira e orgânico, apresentam um aumento da atividade motora e consequentemente espera-se que ocorra um aumento no gasto energético das aves. O nível deste aumento depende do sistema de alojamento e pode variar no inverno e verão (o aumento de atividade no verão pode ser maior do que no inverno). 

Nesse sentido, pode-se adotar duas medidas para atender as necessidades energéticas das aves.

  1. Aumento do volume de ração: Para aves criadas livres de gaiolas recomenda-se um acréscimo de 10% no fornecimento de ração, enquanto o peso corporal para a idade permanecer dentro das metas estabelecidas. 
  2. Aumento da concentração de energia na dieta adicionando uma fonte lipídica: O aumento da densidade energética da ração através do uso de óleos evita gastos adicionais com aditivos. Em contrapartida, a concentração proteica da dieta pode necessitar de um pequeno aumento para garantir a manutenção da musculatura das aves. Estudos futuros devem focar em quantificar essas necessidades. 
  • Minerais 

Como dito anteriormente, aves livres de gaiolas apresentam maior atividade motora e por isso as necessidades de minerais podem ser subestimadas devido às atividades extras realizadas, devido ao acesso ao ar livre. Além disso, as aves criadas em sistemas alternativos são expostas a condições de maior estresse ambiental em comparação às aves criadas em gaiolas convencionais. Por isso, essas aves podem requerer níveis mais elevados de fósforo e zinco como nutrientes essenciais para manter o sistema imunológico. 

Estudos revelaram variação nos níveis de minerais em ovos convencionais e orgânicos, mesmo com níveis de ingestão via alimento semelhante, provavelmente devido a essa maior demanda existente.

Além disso, a exposição ao sol pode influenciar os níveis de vitamina D nas aves, que por sua vez impacta a absorção de cálcio, essencial para a qualidade da casca dos ovos. O manejo adequado dos minerais e da vitamina D é fundamental para garantir a produção de ovos com cascas firmes e saudáveis.

O monitoramento constante dos níveis de minerais na dieta é vital para evitar deficiências que possam comprometer a saúde das aves.

  • Peso do ovo

O peso e os parâmetros relacionados ao tamanho do ovo podem ser influenciados pelo sistema de alojamento das aves. Provavelmente o aumento do tamanho do ovo em sistemas alternativos pode estar relacionamento ao menor número de ovos produzidos durante o ciclo e ao aumento do consumo de ração que pode favorecer o aumento do consumo de proteína e metionina. Neste sentindo, os níveis de proteínas, aminoácidos e energia precisam ser cuidadosamente equilibrados. 

É importante destacar que as recomendações atuais são pensadas para aves criadas em sistemas de bateria e podem estar negligenciando a necessidade real das aves com acesso ao exterior. Entretanto, o fornecimento de uma quantidade maior de ração para aumentar o consumo de energia das aves, pode fazer que o consumo de proteínas e minerais se torne superior ao recomendado contribuindo para o aumento do tamanho do ovo e custos de produção.

O peso da ave também influencia o peso do ovo. Aves mais pesadas tendem a produzir ovos maiores, o que pode aumentar o risco de problemas de saúde, como prolapso ou dificuldades na postura. Além disso, o aumento do consumo de ração pode causar um aumento da gordura abdominal da ave. O que é indesejado. O balanço entre os nutrientes é a chave para evitar esses problemas.

  • Saúde intestinal e imunidade

A exposição a fatores ambientais como solo, vegetação e iluminação natural, bem como acesso a pasto e ingestão de alimentos fibrosos, podem alterar a microbiota intestinal. As galinhas com acesso ao ar livre têm maior probabilidade de serem influenciadas por condições climáticas variáveis ​​(temperatura, chuva, sol, vento) e estações. 

Além disso, o acesso ao exterior permite que as galinhas poedeiras entrem em contato com animais de outras espécies e seus parasitas. Bactérias comensais são essenciais para a digestão de alimentos, metabolismo de nutrientes e síntese. No entanto, evidências sugerem que possíveis desequilíbrios na composição da microbiota intestinal podem estar implicados em uma diminuição na produção e qualidade dos ovos.

Melhorar a saúde intestinal das galinhas poedeiras pode auxiliar na redução dos danos causados por esses desafios. Estratégias nutricionais como o aumento do fornecimento de fibras ou a adição de aditivos na dieta como probióticos, prebióticos e óleos essenciais podem ser importantes aliados na melhoria da saúde intestinal das aves. Esses compostos podem ajudar a reduzir a incidência de infecções intestinais, especialmente em ambientes com maior exposição a parasitas.

  • Ovos bicados

Técnicas nutricionais e de manejo são fundamentais para controlar problemas como o bicar de ovos nas criações de aves livres. Vários fatores podem contribuir para o aumento desse comportamento, incluindo tédio, ansiedade, estresse, instintos naturais e deficiências nutricionais.

Para reduzir esse comportamento indesejado, é recomendável ajustar os níveis de triptofano (0,21 – 0,22) e sódio (0,20 – 0,21) na dieta das aves. O triptofano é um aminoácido precursor da serotonina, um neurotransmissor que regula o humor e o comportamento. O aumento da serotonina pode promover um estado de calma e reduzir o estresse, minimizando comportamentos destrutivos, como bicar ovos. Estudos recentes demonstram que aves com alta frequência de bicadas apresentam níveis de serotonina significativamente inferiores em comparação àquelas que exibem uma menor propensão a bicar. 

Por outro lado, fornecer níveis adequados de sódio ajuda a prevenir estresses fisiológicos e comportamentais nas aves. A deficiência de sódio e cloro pode gerar: perda de apetite, redução da taxa de crescimento, apetite depravado e canibalismo.

Uma medida importante é garantir que as aves tenham acesso a enriquecimento ambiental, como dispositivos de enriquecimento, poleiros e materiais para ciscar. Isso ajuda a reduzir o estresse, diminuindo a probabilidade de desenvolver comportamentos destrutivos, como bicar ovos ou companheiras de grupo.

Outra estratégia eficaz é oferecer uma fonte de fibra, que beneficia o comportamento das galinhas poedeiras. A inclusão de fibras na dieta favorece a saúde intestinal, melhora a plumagem das aves e fornece uma distração, reduzindo o estresse e o tédio.

  1. Considerações sobre a genética 

Embora os ovos brancos sejam mais comuns em regiões onde as galinhas são criadas em sistemas de gaiolas, elas também podem ser mantidas com sucesso em sistemas alternativos. Entretanto, as aves marrons são frequentemente associadas a produção de ovos caipiras e orgânicos. As galinhas marrons são aves maiores, com maiores exigências de manutenção e pior conversão alimentar do que as aves brancas. Algumas empresas de genéticas oferecem aves desenvolvidas especificamente para sistemas caipiras, com foco na robustez e características comportamentais adequadas.

Para concluir

Os guias de manejo de linhagens genéticas oferecem diretrizes nutricionais sobre a ingestão de ração, mas poucos abordam especificamente aves em sistemas livres de gaiolas. Portanto, é essencial avaliar não apenas o consumo de alimentos, mas de nutrientes das aves em seus ambientes de alojamento para ajustar adequadamente a dieta (Figura 2). Os produtores devem conhecer bem seus galpões e aves, colaborando com empresas de ração para ajustar as especificações nutricionais.

Figura 2 – Relação entre as mudanças que podem acontecer entre os sistemas alternativos (A) quando comparado com a produção convencional e as alterações na dieta (B) que precisam ser avaliadas com cautela. 

Figura 2 – Relação entre as mudanças que podem acontecer entre os sistemas alternativos (A) quando comparado com a produção convencional e as alterações na dieta (B) que precisam ser avaliadas com cautela.

Conhecer bem o comportamento e as necessidades das aves é essencial para garantir o sucesso na criação sem gaiolas. O acompanhamento constante da produção e o ajuste das dietas em parceria com empresas especializadas são medidas fundamentais para garantir a qualidade dos ovos e a saúde das aves.

Além disso, a formação contínua dos produtores, com base nas mais recentes pesquisas e inovações tecnológicas, é fundamental para enfrentar os desafios desse tipo de criação e maximizar os resultados de forma sustentável e eficiente.

Referências sob consulta junto ao autor

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