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Alphitobius diaperinus: tão persistente em nossa avicultura quanto os patógenos que ele transmite

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Para ler mais conteúdo de aviNews Brasil 3Tri 2023

Alphitobius diaperinus: tão persistente em nossa avicultura quanto os patógenos que ele transmite

A introdução do cascudinho em sistemas de produção animal ocorreu por meio de ração contaminada (O’Connor, 1987), dispersando-se rapidamente pela prática agrícola de utilização da cama como adubo (Le Torc’h, 1979). Em 1950 foi registrado pela primeira vez infestando aviários (Gould & Moses, 1951), apresentando-se atualmente distribuído em várias regiões do Brasil e do mundo, em altas populações.

 

  • Principais características do inseto

O cascudinho passa pelas fases reprodutivas de ovo, larva, pupa e adulto (Figura 1).

Figura 1.  Larva, pupa, adulto e ovos.

Após o acasalamento, a fêmea de cascudinho tem potencial para colocar mais de 2 mil ovos, com média aproximada de 200 a 400 ovos. Os ovos são colocados na cama do aviário, em rachaduras e fendas no piso do aviário e nas paredes (Figura 2.)

Existem em torno de 6 a 11 instares larvais dependendo da nutrição dessas larvas. Além disso, as condições ambientais necessárias para o desenvolvimento ideal são de 30° a 33°C com aproximadamente 80% a 90% de umidade relativa (UR) (Dunford e Kaufman 2006).

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A pupação pode ocorrer na cama do aviário, no piso de terra, sob a cama ou em rachaduras e fendas nas paredes. A pupa chega à fase adulta em 4 a 17 dias (Rueda e Axtell 1996). Após a emergência da pupa (Figura 3) são necessários 7 dias para os machos atingirem a maturidade sexual e as fêmeas se tornarem receptivas ao acasalamento (Hopkins et al. 1992).

Os adultos podem viver de 3 a 12 meses, com as fêmeas continuando a produzir ovos durante a maior parte de sua vida em intervalos de 1 a 5 dias. Relata-se que adultos vivem mais de 2 anos em condições experimentais (Falomo, 1986). As densidades de insetos em um aviário podem chegar de 10 mil a 20 mil indivíduos por metro quadrado (Arends, 1987).

O ciclo biológico do Alphitobius diaperinus (Figura 4) se completa em 55 dias, em temperatura de 27°C e 80% UR.

Figura 4. Representação do ciclo de vida do cascudinho.

Após cinco dias da postura, eclode de cada ovo uma larva esbranquiçada, com 1,5mm de comprimento.

A fase larval estende-se por 38 dias, quando os imaturos atingem o tamanho de 13,8mm de comprimento e coloração marrom escura. As larvas passam por até 11 estágios de desenvolvimento (Vergara e Gazani, 1996).

Após a fase larval, sofrem ecdise e empupam por cinco dias, emergindo adultos de coloração branca, que, após quatro dias, adquirem coloração característica (marrom).

Os adultos começam a se reproduzir 20 dias após a emergência (Schafer da Silva et al., 2005).

Foi observado que à temperatura de 22°C o tempo de desenvolvimento das fases do cascudinho é maior, porém, a sobrevivência é baixa, e que a temperatura de 31°C foi considerada a mais adequada para o desenvolvimento das fases imaturas, com alta sobrevivência.

Situações com baixas temperaturas – inferiores a 16,5°C – podem contribuir, de maneira eficiente, no controle dos cascudinhos, uma vez que não ocorre o desenvolvimento das fases imaturas, o que leva a diminuição da população (CHERNAKI & ALMEIDA, 2001). Deste modo, demonstrando um momento ideal para realizar o controle estratégico do inseto com inseticida químico.

 

O cascudinho é responsável por diversos problemas que afetam direta ou indiretamente as aves.

Esses insetos podem ser ingeridos pelas aves, podendo comprometer o consumo de ração, proporcionando menor aproveitamento dos nutrientes e, consequentemente, afetar o desempenho produtivo (Axtell & Arends, 1990). De acordo com Despins (1987), perus com 2 a 10 dias de idade podem consumir de 174 a 221 larvas de cascudinhos, ave/dia. E pintinhos durante os primeiros 10 dias de vida podem consumir uma média média de 450 larvas / ave / dia (Gomes, 2000) (Figura 5).

Figura 5. Ingestão de cascudinhos.

Estudos indicam que o Alphitobius diaperinus atua como fonte de contaminação de Campylobacter spp. (Jacobs-Reitsma et al., 1995; Jespersen, 1996; Bates et al., 2004), Escherichia coli (McAllister et al., 1996), entre outros. No Brasil, há registro da presença de diversas enterobactérias em adultos de Alphitobius diaperinus, dentre elas E. coli, que causa a colibacilose em frangos de corte, Proteus vulgaris, Proteus mirabilis, Enterobacter ssp., Enterobacter agglomerans, Enterobacter gergoviae, Enterobacter sakasakii, Citrobacter diversus e Klebsiella pneumoniae (Chernaki-Leffer et al., 2002).

Entre todas essas bactérias, as salmonelas apresentam maior importância atualmente na avicultura, devido ao risco de contaminação alimentar em seres humanos. A presença desta bactéria em carcaça de frangos de corte pode influenciar na comercialização deste produto e, portanto, é de extrema importância econômica.

Em estudos laboratoriais in vitro foi observado que Alphitobius diaperinus adultos excretam Salmonella Thompson durante 15 dias após serem alimentados durante 24 horas com alimento contaminado na concentração de 108 UFC/ml (Von Geissler & Kösters, 1972, citado por Davis & Wray, 1995).

De maneira semelhante, McAlllister et al. (1994) relataram que os adultos de Alphitobius diaperinus permanecem positivos para Salmonella Typhimurium por até 24 dias, após serem alimentados com ração inoculada com 3×108 UFC/ml.

Além disso, De las Casas et. al. (1968) observaram que cascudinhos adultos mortos e armazenados em ambiente estéril permanecem positivos para Salmonella Typhimurium por até 45 dias.

A salmonela tem sido isolada de Alphitobius diaperinus não apenas mediante contaminação induzida em laboratório, mas também de insetos provenientes de aviários. Harein et al. (1970) isolaram cepas de Salmonella spp. em adultos de Alphitobius diaperinus, identificadas como Salmonella Heidelberg, Salmonella Whorthington, Salmonella San Paul e Salmonella Typhimurium.

Em estudo conduzido por Gazal et al.(2021), avaliando o uso de antimicrobianos no sistema de produção de frangos de corte, concluiu-se que o Alphitobius diaperinus é um dos fatores que influenciam na presença de linhagens de E.coli produtoras de β-lactamase de espectro estendido (ESBL)/AmpC e resistentes à fosfomicina neste sistema de produção no sul do Brasil.

Em estudo conduzido por Poole e Crippen em 2009 foi comprovado que existe uma transferência horizontal de plasmídeos de resistência antimicrobiana que ocorre entre Salmonella e a E. coli no intestino do Alphitobius diaperinus, e que esses insetos podem ser usados como um modelo in vivo para estudar a transferência de genes de resistência. (Figura 6)

Figura 6. Salmonella e E. coli com transferência de genes de resistência.

Além disso, os vírus da leucose aviária e da doença de Marek também podem ser transmitidos para as aves através de cascudinhos infectados (Eidson et al., 1966; Lancaster e Simco, 1967)

O cascudinho também é citado como hospedeiro intermediário de cisticercóides de helmintos que afetam frangos (Moya et al., 1977; Uchida, 1980; Godoi & Chaudhuri, 1982; Karunamoorthy et al., 1994).

Para Baptista (2010), os cestódeo como a Raillietina spp. que parasitam o intestino delgado das aves necessitam de um hospedeiro intermediário que pode ser moscas, formigas, baratas e coleópteros coprófagos como o Alphitobius diaperinus. (Figura 7).

Figura 7. Raillietina spp.

cascudinho no inseticidaA transmissão transestadial (transmissão da bactéria presente nas larvas para as fases de pupa e adulto) de Salmonella spp. parece ocorrer no cascudinho. Esta pode ser a razão pela qual certas doenças permanecem endêmicas em um aviário em particular, apesar dos extensos esforços de limpeza e desinfecção (Calibeo, 2002).

No experimento realizado por Crippen et al.(2012) foi comprovada a retenção intestinal transitória e a persistência de bactérias do gênero Salmonella mesmo após o cascudinho passar pelo processo de metamorfose.

Foram avaliados, no estudo, adultos e larvas de cascudinhos em uma única exposição por duas horas com Salmonella Typhimurium 108 UFC/ml.

A variação no tempo de retenção de Salmonella por adultos variou de 11 dias para adultos e 12 dias para larvas. Sendo que 19% das larvas conseguiram carrear a salmonela através da sua metamorfose e eclosão, com 5% das exúvias pupais sendo também positivas.

Concluindo que os Alphitobius diaperinus são capazes de eliminar Salmonella em suas fezes por até 12 dias, após uma única exposição de duas horas ao agente infectante (Figura 8).

Figura 8. Porcentagem (%) de adultos e larvas de cascudinhos excretando diariamente fezes positivas para salmonela até 12 dias após exposição por duas horas com o agente. A média e o intervalo do experimento em triplicata são apresentados nos gráficos de pontos de dispersão. Os dados foram coletados diariamente durante 21 dias, no entanto, nenhuma Salmonella foi recuperada após 12 dias (Os gráficos representam os primeiros 15 dias).

 

A reutilização da cama nos aviários favorece a permanência e a reprodução do Alphitobius diaperinus nos aviários, predispondo a um aumento populacional de maneira significativa. Devido à grande demanda de produção de frangos de corte no Brasil, a troca de cama está sendo realizada com menos frequência.

Os cascudinhos podem sobreviver no intervalo entre os lotes, albergando patógenos até o recebimento de novas aves.

Desta forma, dando a devida importância aos impactos que esse inseto pode causar na indústria avícola, é necessário um estratégico controle e monitoramento populacional da infestação do Alphitobius diaperinus dentro da cadeia produtiva de aves no Brasil.

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