O sistema de criação convencional em gaiolas de bateria tem recebido críticas constantemente, por não fornecer espaço suficiente para o animal expressar seus movimentos, comportamentos naturais e exercitar-se, promovendo dessa forma, maior susceptibilidade a fraturas.
Não basta mudar os sistemas de produção se as poedeiras morrem de calor
Até quando olharemos para o espaço (densidade), alojamento e não iremos observar uma das principais causas de perdas produtivas (mortalidade ou produção de ovos) que é o CALOR? Veja o que dizem os especialistas da Embrapa e Nupea (Esalq/USP).
Atualmente, grandes são as preocupações relacionadas ao bem-estar de aves poedeiras em toda a cadeia produtiva. Praticamente 95% da produção brasileira de ovos, é oriunda de sistema convencional de produção, ou seja, dos sistemas com gaiolas convencionais.
Primeiramente, a grande discussão foi relacionada ao espaço físico de cada gaiola, em que cada país apresentava um modelo com áreas diferenciadas. Com relação à densidade animal - gaiola, existe uma grande variabilidade.
No Brasil, por exemplo, a área de gaiola por ave utilizada é em média de 350cm² (300-400cm2). Já nos Estados Unidos e alguns países da Ásia, a densidade média utilizada é de 400 cm²; enquanto, na Noruega a densidade é de 700 cm²/ave (SILVA; MIRANDA, 2009).
Nessa mesma sequência, na evolução das pesquisas em relação ao alojamento das galinhas, vários estudos avaliaram também as chamadas gaiolas enriquecidas, aquelas que apresentam uma maior área/animal, poleiros, área de postura e lixas para desgastes das unhas.
Modelos como os gaiolões, em que as aves são criadas em grupos de 60 a 80 galinhas (variando de acordo com o modelo) já foram amplamente utilizadas na America do Norte e Europa.
As questões relacionadas ao bem-estar animal estão intimamente interligadas ao conceito de saúde única, envolvendo: animal, homem e ambiente. Estas, por sua vez, estão inseridas no conceito moderno da avicultura do futuro. A sustentabilidade dos sistemas de produção e a postura ética na produção de alimentos é uma realidade mundial.
A ciência do bem-estar animal baseia-se num conceito multifatorial, existem dificuldades sobre como medir e quanti-qualificar o bem-estar das diferentes espécies animais de postura. Deve-se considerar a boa alimentação, boa instalação, boa saúde e o bom comportamento.
O importante é analisar as ocorrências e os níveis elevados de diferentes incidências que comprometam a vida dos animais, como por exemplo problemas ósseos (artrites e artroses), claudicações, lesões de pele, nível de empenamento, doenças, comportamentos anômalos, índices zootécnicos, dentre outros. Essas ocorrências são fundamentais para que se consiga medir com eficiência o bem-estar de forma correta e associá-lo a produção ética de alimentos.
Simultaneamente, em todo o mundo as discussões relacionadas à ambiência, bem-estar e instalações para aves poedeiras não estão focadas na climatização do ambiente, mas nas eficiências dos sistemas produtivos, uma vez, que os ambientes em geral são climatizados (JONES et al., 2014; MENCH et al., 2014; ZHAO et al., 2015).
Passa-se, então, para uma análise comparativa entre os sistemas de criação que, nesse caso, envolvem os sistemas de gaiolas convencionais, os sistemas de gaiolas enriquecidas, os sistemas de aviários livres (sem gaiolas) e os sistemas free range.
Partindo dessas premissas, as discussões se concentram nos modelos de sistemas “No Cage” (Cage-free, free-range) e sistema “In Cage” (convencional e enriquecidas ou mobiliadas).
Essa discussão é ampla, envolve não só as questões técnico-econômicas, mas o impacto da mudança em relação a toda a cadeia, incluindo a agregação de valor ao produto. Porém, deve-se considerar o posicionamento mercadológico das marcas e as relações diretas com o consumidor final.
Várias são as empresas que estão assumindo os compromissos para 2025 adotarem e consumirem ovos dos sistemas “No Cage”, mas nossa discussão não trata do modelo a ser adotado, mas da relação do modelo com o clima tropical do país e, consequentemente, de cada região produtora.
Não basta tirar as aves das gaiolas, ou criá-las em sistemas livres, Cage-free ou free-range, ou ainda em gaiolas mobiliadas, se as galinhas morrem devido ao estresse térmico, seja nos galpões de criação sem climatização, seja nos sistemas livres de gaiolas.
A discussão é: até quando olharemos para o espaço (densidade), alojamento e não iremos observar uma das principais causas de perdas produtivas (mortalidade ou produção de ovos) que é o CALOR?
À medida que a temperatura ambiente aumenta, a eficiência da perda de calor sensível diminui, em razão do menor gradiente de temperatura entre a pele do animal e a do ambiente. A manutenção da temperatura corporal é determinada pelo equilíbrio entre o ganho e a perda de calor (ALVES et al.,2007). As aves respondem negativamente às variações bruscas de temperatura ambiente, principalmente quando associadas ao acréscimo de umidade relativa do ar. Nesse caso, deve-se atentar para a amplitude térmica das regiões. No Brasil muitas vezes ela chega a ser maior que 20ºC.
Dentre as consequências de exposição ao calor dentro das instalações, a mais importante é o efeito do estresse térmico sobre os animais (YAHAV; RUSAL; SHINDER, 2008). O desconforto térmico em aves de postura provoca uma série de consequências que, por sua vez, estão associadas à:
- queda no consumo de ração;
- menor taxa de crescimento;
- maior consumo de água;
- aceleração do ritmo cardíaco;
- alteração da conversão alimentar;
- queda na produção de ovos; e
- maior incidência de ovos com casca mole (BARBOSA FILHO et al 2007).
Os elementos climáticos que mais afetam o desempenho das galinhas poedeiras são a temperatura ambiente, umidade relativa e a velocidade do ar.
Nas aves, o calor é dissipado por meio da evaporação respiratória, evaporação cutânea e perda de calor sensível através dos processos de radiação, convecção e condução. A perda de calor por evaporação através da respiração ofegante é associada com a perda de água corporal, portanto, em excesso, poderá provocar desidratação (YAHAV; RUSAL; SHINDER, 2008).
No tocante à redução da temperatura ambiente, o uso de ventilação forçada auxilia muito na dispersão de calor gerado pelas aves, enquanto a associação de ventilação com algum tipo de nebulização reduz a temperatura interna de aviários. O uso de ventilação com nebulização diminuiu a temperatura do interior do aviário como mostra pesquisa realizada na América do Norte (Tabela 1).
Sistemas conjugados, onde se realiza o resfriamento adiabático evaporativo (SRAE), apresentam grande eficiência no controle dos ambientes internos de produção. Porém, a mitigação do efeito de calor, por meio da ventilação forçada associada ao nebulizador, pode ser utilizada com sucesso em aviários de postura.
De qualquer forma, vale lembrar que a tipologia nacional é de grande maioria de aviários totalmente abertos e sem controle nenhum da ambiência interna, o que torna essa realidade muito diferente.
Observando as variações da temperatura, verifica-se que a redução de praticamente 2,3°C e 2,9°C entre os períodos da manha e tarde, não foram expressivas em relação ao ambiente sem a nebulização. Mas deve-se considerar que, nessas condições, em geral os aviários são fechados com o ambiente todo controlado. Nesse sentido, qualquer modificação visando as melhorias dessas condições internas terá grande impacto na ambiência do galpão e consequentemente nos animais alojados.
O importante é associar as propostas de melhorias nos sistemas de produção de ovos às necessidades térmicas das galinhas poedeiras.
Os modelos europeus ou norte americanos apresentam tipologias diferentes das nacionais, onde a estrutura já é fechada preconizando o inverno rigoroso, portanto, os sistemas “no cage” já estão sob ambientes controlados, o que não é realidade nacional.
Partindo-se dessas condições, deve-se considerar que a ambiência deverá sempre estar associada, em paralelo, com o bem-estar dos animais em países de clima tropical como o Brasil, sendo que a isso chamamos de paralelismo conceitual. O paralelismo indica que devem sempre caminhar juntos, não existe bem-estar animal sem um programa de ambiência implantado.
Porém, o fato de se ter uma ambiência efetiva, não quer dizer que atende-se a todos os requisitos de um programa de bem-estar animal, que é mais amplo.
A exposição de aves alojadas ao estresse térmico em clima tropical é uma realidade diária em nossas condições de produção. O aspecto mais importante é a mitigação dessa exposição, considerando os aspectos eficiência e economia do processo adotado.
Quando se busca um sistema de climatização adequado, deve-se considerar os aspectos biológicos, técnicos, climáticos e econômicos. O estabelecimento de limites será balizado pelas respostas das aves aos limites críticos para as diferentes fases de produção, consequentemente expostas a níveis de ventilação e nebulização, ou diferentes temperaturas, onde sempre serão consideradas a sensação térmica das aves, e suas condições de conforto.
Portanto, a implementação de um programa de bem-estar animal deve ser programado escalonadamente, de forma clara e fácil de ser assimilado por colaboradores e produtores. Uma fase de transição deve ser cautelosa, pautada em avaliações econômicas, marketing do produto e perfil do mercado consumidor. Os mecanismos de quantificação e avaliação do bem-estar deverão ser baseados nos conhecimentos da biologia das espécies, como são utilizados e quais as dificuldades regionais de implantação.
Baseando-se nessas considerações fica aqui o nosso alerta para que as discussões sejam amplas, não se tratando apenas da liberdade aos animais, mas fornecer condições mínimas para que possam viver em conforto, adaptando-se as realidades de cada sistema produtivo, ao clima regional e ao animal.
Não se trata apenas de soltar as galinhas, mas fornecer condições de uma vida saudável.
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